Apesar de desativado há quase oito anos, o antigo lixão de Maceió ainda desafia o poder público a encontrar uma solução sustentável para o local. Cravado numa área urbana, entre os bairros de Cruz das Almas e São Jorge, o espaço necessitará de, no mínimo, mais 40 anos para se recuperar da degradação e cobra um alto preço pelo crescimento desordenado: monitoramento constante, ações reparadoras e restrições na ocupação do seu entorno.
A área - que equivale a 46 campos de futebol - começou a receber resíduos na década de 30, mas foi no final da década de 60 que teve início o despejo de dejetos sem nenhum tipo de cuidado, transformando o local em um grande lixão a céu aberto. A estimativa é que em 2010, ano em que foi desativado, o local abrigava algo em torno de 3 milhões de metros cúbicos de resíduos, atingindo em alguns pontos mais de 30 metros de altura de lixo acumulado.
"Como em todo lixão, os impactos eram a contaminação do solo e das águas por chorume; a contaminação do ar por gases provenientes da decomposição, gerando maus odores, e por fuligens, devido a queima de resíduos; proliferação de vetores de doenças, como moscas, mosquitos, baratas e ratos; além do impacto visual e social, com a presença de catadores na área", explica a professora e pesquisadora da Universidade Federal de Alagoas Nélia Callado.
Para minimizar os efeitos negativos, a desativação do lixão veio acompanhada de duas ações imediatas: a implantação de uma Central de Tratamento de Resíduos, como é chamado o aterro sanitário, e de uma série de ações reparadoras no local.
"Após a desativação, as intervenções realizadas no local foram baseadas na delimitação e cercamento total da área; cobrimento dos resíduos e retaludamento [inclinação]; plantio de gramas sobre o talude; construção do sistema de drenagem do lixiviado [produto usado para limpeza]; construção do sistema de drenagem dos gases; construção do sistema de drenagem de águas pluviais; inclusão social dos catadores; acompanhamento e monitoramento da área", informou a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Sustentável de Maceió.
As medidas começam a surtir efeito. A reportagem da Gazetaweb teve acesso, com exclusividade, a um relatório elaborado pela empresa Estre, responsável pela gestão do antigo lixão, que aponta que oito anos após o encerramento, houve redução do recalque da massa de lixo e baixa produção de gás. Porém, a redução não afeta o monitoramento constante que é feito no local.
MESMO APÓS RECUPERAÇÃO, ÁREA TERÁ RESTRIÇÕES
Apesar dos esforços do poder público para recuperar o espaço, os resquícios de anos de despejo desordenado de resíduos exigem cuidados, principalmente, no abastecimento d'água. Além disso, a área dificilmente poderá ser ocupada por habitações um dia, devido às características do terreno.
"Embora o monitoramento mostre pouco recalque e pouca produção de chorume e gases nessa área, mesmo depois de recuperada, a implantação de edificações sobre ela é desaconselhável, devido a possíveis problemas relacionados à capacidade de suporte do terreno e à possibilidade de infiltração de gases com alto poder combustível e explosivo", explica a pesquisadora Nélia Callado.
Estudos desenvolvidos por professores e alunos da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) revelam que o local ainda deve eliminar chorume por um período que varia de 20 a 30 anos, o mesmo tempo que ainda eliminará gases. Esse é o tempo para que a maior parte da massa de lixo aterrada seja degradada.
Atualmente, parte dos gases gerados são liberados para atmosfera por meio de 37 drenos de gás que foram instalados e outra parte percorre a porosidade da massa do aterro, sem nenhum tipo de coleta. O volume é insuficiente para contaminar de forma significativa o meio ambiente, mas ainda oferece riscos de explosão para construções no entorno do antigo lixão.
"Os lugares mais comuns para eles se acumularem são porões, espaços rastejantes, garagens subterrâneas. Assim, construções com essas características, que permitam a entrada do gás, são os lugares mais fáceis para acumular gás, sendo, portanto, vulneráveis a possíveis explosões. Porém, quanto mais afastada do aterro estiver a estrutura, mas improvável se torna a migração dos gases e o perigo de uma possível explosão", conclui a pesquisadora Nélia Callado.
"Nós hoje pagamos por erros do passado, foram mais de 40 anos de utilização daquele local para receber o lixo da cidade. Desde 2010 esse monitoramento vem sendo feito de forma bem próxima. A gente espera que, no futuro próximo, tenhamos uma área arborizada para que a cidade possa aproveitar uma área tão bonita", explica Davi Maia, superintendente de Limpeza Urbana de Maceió.
PREFEITURA PLANEJA TRANSFORMAR ESPAÇO EM PARQUE
Localizado em uma área urbana privilegiada, o espaço onde funcionou o lixão deverá se transformar em um parque socioambiental. Pelo menos essa é a proposta da Prefeitura de Maceió. No entanto, o próprio prefeito Rui Palmeira, admite que a falta de recursos próprios dificulta um investimento massivo. A ideia é formalizar uma Parceria Público Privado (PPP) para viabilizar a obra.
"O projeto é transformar o local em um parque, com árvores de grande porte, como Ipês, Eucaliptos e Pau-Brasil, e dotar o espaço com uma estrutura básica para lazer, incentivando a visita de maceioenses e turistas ao local. Este é um projeto de longo prazo que se dará gradativamente, com foco, sobretudo, no reflorestamento", informou a Secretaria Municipal de Desenvolvimento Sustentável.
A primeira etapa do projeto está sendo baseada no plantio de árvores de grande porte. No início de março, foram plantadas cerca de 250 mudas de plantas nativas da Mata Atlântica. Um segundo plantio está previsto para o mês de abril e, conforme a Prefeitura, a meta é chegar a mil mudas plantadas até o final do ano.
Segundo o secretário Gustavo Acioli Torres, a arborização "colabora com a preservação e a recuperação dos ecossistemas degradados, controla a erosão do solo e previne deslizamentos de terra, retém os poluentes da atmosfera, reduz o processo de aquecimento global e ajuda a contemplar o embelezamento da paisagem e reduzir a poluição acústica da cidade".
"Trata-se de um grande trabalho iniciado pela Prefeitura para recuperar ambientalmente um local onde, por décadas, só se via lixo, grande movimentação de caminhões e crianças trabalhando. A recuperação do local será gradativa, com um número crescente de plantio de árvores. Todo o levantamento já foi realizado, um projeto de revitalização foi elaborado e, logo em breve, vamos fazer a substituição dos materiais danificados. A ideia é deixar a região própria à visitação, inclusive com a instalação de equipamentos de lazer que possam ser utilizados durante a visita ao local. Sem dúvidas é uma região privilegiada, com uma das vistas mais bonitas de nossa cidade", conclui Gustavo Acioli Torres.